Dentadinhas

segunda-feira, abril 25, 2005

Hobsbawm

É quase de promiscuidade a relação entre o jornalismo e a história, no meu entendimento. Isso porque o jornalismo age até o limite da história: enquanto ao primeiro só interessa o atual, quando um fato perde esse apelo passa ao domínio da história. Por outro lado, o jornalismo pode e deve se debruçar sobre fontes da história (e o faz constantemente ancorado pelo que, no “jornalês”, chamamos de “gancho”) bem como a história pode buscar no relato jornalístico uma fonte para sua pesquisa.
Escrevo isso porque, pelo menos no jornalismo, o uso de adjetivos e juízos de valor é algo totalmente rechaçado. Não é à toa que sempre pensei que os relatos históricos tinham de ser tão objetivos quanto um bom texto jornalístico... até ler Hobsbawm.
Em “A Era das Revoluções”, me chamou bastante a atenção o fato de não terem sido dispensados adjetivos. Por ex., no capítulo “A Ideologia Secular”, ele escreve: “O filosoficamente débil John Locke, mais que o soberbo Thomas Hobbes, continuou sendo o pensador favorito do liberalismo vulgar”.
Frase interessantíssima. Adorei. Apesar de ter sido conquistada pela obra logo na primeira frase do primeiro capítulo: “A primeira coisa a observar sobre o mundo na década de 1780 é que ele era ao mesmo tempo menor e muito maior que o nosso”.
Aquela velha história: instiga teu leitor que, quando ele se der conta, já estará enrolado no fio narrativo que o conduzirá à última linha.
Assim aconteceu comigo, e então encontrei a primeira resposta: o mundo conhecido era menor. “Era menor geograficamente, porque até mesmo os homens mais instruídos e bem informados da época conheciam somente pedaços do mundo habitado.” Algumas linhas depois, a segunda resposta: o mundo era, para a maioria dos seus habitantes, incalculavelmente grande. “A simples dificuldade ou incerteza das comunicações faziam-no praticamente maior do que é hoje.”
No entanto, mas não menos previsível, minha preferência é pelo trecho em que Hobsbawm discorre sobre as cidades de província à época. Eram as mesmas “para onde rumaram o inspetor-geral de Gogol, a fim de aterrorizar os ricos, e Chichikov, decidido à compra de almas (...) Mas foi também destas cidades que saíram os jovens e ardentes ambiciosos para fazer fortuna ou revoluções, ou as duas coisas ao mesmo tempo”. Como Robespierre, Babeuf, Napoleão.
Simplesmente genial.